OPINIÃO

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Tanto o ex-juiz e ex-ministro Sergio Moro quanto o presidente Jair Bolsonaro são investigados no Inquérito 4.831, que tramita no Supremo Tribunal Federal sob a relatoria do ministro Celso de Mello. A investigação foi instaurada em 28 de abril, quatro dias após Moro deixar o cargo de ministro de Estado — cargo de confiança que aceitou ocupar ainda em 2018, ano em que ocorreram as eleições presidenciais.

É possível extrair das recentes manifestações de Moro e de seus advogados dois enunciados principais sobre essa investigação: limites para quem exerce funções públicas e observância das garantias inerentes ao exercício do direito de defesa.

Quanto ao primeiro ponto, o advogado Rodrigo Sánchez Rios, que coordena a defesa de Moro, escreveu no jornal Folha de S. Paulo em 17 de maio sobre a importância de os ocupantes dos cargos públicos atuarem "em prol do interesse público e da sociedade brasileira, e não das vontades, dos interesses e dos projetos dos ocupantes momentâneos" desses postos.

Quanto ao segundo ponto, Moro e sua defesa buscam o acesso à íntegra de documentos supostamente relacionados ao citado inquérito policial  para atender a garantia da paridade de armas no exercício do direito de defesa.

Não há qualquer aspecto conceitual que mereça divergência em relação a esses pontos defendidos por Moro e sua defesa. A observância de limites para a atuação de agentes do Estado, assim como a observância de todas as garantias fundamentais no exercício do direito de defesa, é algo que sempre defendemos na condição de advogados e de cidadãos. O respeito a esses parâmetros decorre das conquistas civilizatórias e, ademais, é a única forma de vermos cumpridas a Constituição Federal e as obrigações internacionais assumidas pelo Brasil por meio de tratados e convenções.

Como juiz, porém, Moro atuou na contramão desses parâmetros. Agiu como déspota. Tratou acusados como inimigos; negou a essência do direito de defesa; devassou; humilhou; atacou e estimulou ataques a advogados. Sincronizou o processo com o calendário político. Aceitou cooperação internacional informal e incompatível com a lei brasileira. Também apostou no segredo prometido pelo aplicativo Telegram para praticar condutas incompatíveis com a magistratura e com as garantias fundamentais, como foi revelado pela serie de reportagens denominada "Vaja Jato", publicada pelo portal The Intercept Brasil e por diversos outros veículos de imprensa (Folha de S. PauloUOLEl PaísVeja, Reinaldo Azevedo, entre outros).

Moro ainda praticou um dos mais perversos atos contra o exercício da advocacia e do direito de defesa: grampeou o principal ramal do nosso escritório por 23 dias para acompanhar, em tempo real, a estratégia de defesa que discutíamos para o ex-presidente, como foi relevado por esta ConJur. Planilhas depositadas na secretaria da 13ª Vara Federal Criminal de Curitiba mostram que agentes da Polícia Federal ouviam nossas conversas simultaneamente à captação e faziam resumos que eram levados a Moro.

O "caso Lula" enfeixa todos esses vícios da atuação de Moro como juiz, como foi demonstrado em Habeas Corpus que protocolamos no Supremo Tribunal Federal em novembro de 2018 (HC 164.493/PR) —reforçado em junho de 2019 com as mensagens da "Vaza Jato".

Moro promoveu uma verdadeira cruzada contra Lula com o objetivo de interferir no cenário político do país. Moro agia como político porque iria se tornar um político. O então juiz instruiu e julgou processos contra Lula com manifesta parcialidade e colocou em xeque o próprio sistema de Justiça.

As mesmas razões apresentadas no presente por Moro no exercício do seu próprio direito de defesa reforçam a necessidade de o sistema de Justiça corrigir os erros do passado, causados pelo próprio Moro.

O julgamento da suspeição do ex-juiz é um passo fundamental nessa direção. E compete ao mesmo Supremo para o qual Moro dirige atualmente suas manifestações.

 é sócia do escritório Teixeira, Martins e Advogados.

 é sócio do escritório Teixeira, Martins e Advogados.

Revista Consultor Jurídico