Não basta apenas defender Reforma Tributária. É preciso separar os que querem retomar o Estado de bem-estar social daqueles que querem aprofundar o modelo de Estado mínimo.

Dão Real Pereira dos Santos

Estamos em pleno período eleitoral e, neste ano, diferentemente do que ocorria em outros pleitos, as questões referentes aos temas tributários começam a ocupar uma parte relevante dos debates políticos. Alguns pontos aparecem nos discursos com mais frequência, por exemplo, a correção da tabela do Imposto de Renda das pessoas físicas e a necessidade de se tributar os lucros e dividendos distribuídos. Até mesmo a necessidade de tributar os super-ricos já está aparentemente assimilada.

Mas, também, em meio a muitos discursos e debates, aparecem promessas de redução de tributos, criação de um imposto único, simplificação tributária e de não tributação de rendas do capital. Há até quem diga que com menos tributos teremos mais e melhores serviços públicos. Outros não escondem que querem mesmo é reduzir o Estado e privatizar os serviços públicos.

O sistema tributário tem caráter instrumental e constitui-se como um meio para a obtenção de algum resultado desejado, seja em relação à garantia de recursos suficientes para financiar as políticas necessárias, seja como indutor de uma determinada realidade social, econômica e ambiental desejada.

Neste sentido, os tributos podem e devem ser utilizados para promover o desenvolvimento, regular o consumo e as relações de trabalho. Sempre haverá uma configuração de sistema tributário mais favorável a uma política desenvolvimentista e outra mais voltada a uma economia primário-exportadora. A política tributária poderá estimular as relações formais de trabalho e de assalariamento, mas poderá também beneficiar as terceirizações e a precarização. No espaço da sustentabilidade ambiental, podemos ter tributos que estimulem atividades menos nocivas ao meio ambiente ou o contrário.

Além disso, é importante considerar que o sistema tributário não deve ser absolutamente rígido e deverá se adequar aos diferentes estágios de desenvolvimento e de desigualdade em que nos encontrarmos. Por exemplo, um imposto sobre as Grandes Fortunas pode ser necessário em tempos de profunda concentração de riquezas, mas tornar-se ineficaz quando a desigualdade já seja razoavelmente superada.

Tendo em conta, portanto, que o sistema tributário, além de ser fonte de recursos para o financiamento das políticas públicas, pode e deve cumprir funções extrafiscais importantes, é preciso avaliar a coerência das propostas tributárias dos candidatos com o modelo de Estado e de sociedade que queremos construir, pois a efetividade dos projetos sociais e econômicos depende da calibração adequada de seus instrumentos, dentre os quais, a política tributária.

Assim, nestas eleições, não basta o candidato defender uma reforma tributária. Isso todos fazem. É preciso separar os que querem retomar a construção do Estado de bem-estar social previsto na nossa Constituição Federal daqueles que querem aprofundar o modelo de Estado mínimo, com políticas públicas privatizadas.

É preciso separar aqueles que defendem o desenvolvimento econômico inclusivo baseado na indústria, na ciência e na tecnologia daqueles que querem aprofundar o modelo primário exportador de commodities. Nem sempre essas posições ficam muito claras nos discursos, mas o sistema tributário que cada um defende é um bom indicador do modelo de Estado, de sociedade e de desenvolvimento que orienta seus programas políticos.

Dão Real Pereira dos Santos é  presidente do Instituto Justiça Fiscal e membro do coletivo Auditores Fiscais pela Democracia

Fonte: IJF
Data original da publicação: 21/09/22

DMT: https://www.dmtemdebate.com.br/a-tributacao-que-defende-revela-seus-projetos/