Novas regras valeriam imediatamente para servidores estaduais após aprovação das medidas pela União

Flavia Lima

SÃO PAULO

​​Pelo menos um terço dos governadores apoia uma reforma da Previdência na gestão de Bolsonaro sem carência —ou seja, a mudança valeria para os estados imediatamente após aprovada, sem tempo de transição para eventual adaptação nas regras.

A Folha apurou que os governos de Minas Gerais, Rio Grande do Sul, Rio de Janeiro, São Paulo, Goiás, Roraima, Mato Grosso do Sul, Paraná e Acre se movimentam para que, uma vez aprovada, a reforma da Previdência seja incorporada pelos estados sem que precisem ser cumpridos os seis meses previstos na reforma de Michel Temer.

Na proposta de Temer, se, após a aprovação da reforma proposta pela União, os estados não aprovassem leis próprias para mudar o seu conteúdo em até seis meses, as regras valeriam para eles.

A expectativa é que haverá apoio até de estados governados pela oposição, como Rio Grande do Norte e Piauí. Os estados também vão acompanhar com atenção julgamento do STF (Supremo Tribunal Federal) marcado para 27 de fevereiro que aborda a possibilidade de redução de carga horária e salários de servidores em caso de gastos acima do estabelecido pela LRF (Lei de Responsabilidade Fiscal).

A aceitação de medidas fiscais mais duras por um grupo que há cerca de dois anos nem sequer falava em reforma da Previdência é resultado direto do agravamento da crise nas contas públicas estaduais.

Sem recursos para pagar salários ou manter serviços básicos e também sem aval da União para elevarem o endividamento, alguns estados veem nessa espécie de “imposição da reforma” a melhor saída para se livrar das pressões dos servidores contra as mudanças na aposentadoria.

Segundo especialistas, a reforma da Previdência é crucial para os estados. Esses entes comprometeram boa parte de suas receitas com a folha de pagamento, em especial com inativos.

Entre 2012 e 2014, quando ainda contavam com o aval da União para se endividar, muitos dos estados usaram os recursos que obtiveram de organismos internacionais para elevar a folha de salários e dar reajustes no lugar de investir.

Entre 2013 e 2015, segundo Pedro Schneider, economista do Itaú Unibanco, os gastos dos estados com inativos cresceram 8% acima da inflação.

O resultado é uma situação fiscal preocupante e, em alguns casos, subdimensionada. “É como o paciente que faz um raio-X e esconde do médico uma das fotos”, diz Schneider, ao lembrar que estados chegaram a excluir auxílios e aposentadorias dos gastos com pessoal para burlar os limites da LRF. O movimento agora é inverso. Estados refazem as contas para não serem punidos por seus Tribunais de Contas e obter ajuda do governo federal —que avalia rever as regras de adesão ao programa de recuperação fiscal e aceitar um número maior de estados.

O Rio Grande do Norte, por exemplo, sustentava há poucos meses um nível de despesa com pessoal perto de 50% da receita, mas no relatório do último bimestre de 2018 —ainda não divulgado— vai mostrar que a relação é de 70%.

O mesmo ocorre com Minas Gerais. O gasto com pessoal, ao redor de 60% antes da revisão, deve chegar a 80% no próximo relatório.

Não é por acaso que Minas e Rio Grande do Norte estão entre os sete estados que declararam calamidade financeira, mecanismo de proteção que permite que governadores gastem acima dos limites permitidos sem sofrerem punições até que se rearranjem.

Completam o grupo Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Roraima, Mato Grosso e Goiás.

Segundo fontes com conhecimento das contas, Sergipe e Acre podem ser os próximos.

É claro que a crise econômica pesou, reduzindo a arrecadação, mas o gasto com pessoal foi o que mais prejudicou o caixa dos estados, diz Vilma da Conceição Pinto, pesquisadora do Ibre/FGV (Instituo Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas).

Olhando a arrecadação do ICMS (principal fonte de receita dos estados), a situação dos governos que decretaram calamidade se assemelha ao daqueles que não decretaram.

Mas, dos 5 estados com a pior relação entre gastos com pessoal e gastos totais, 4 decretaram emergência.“É impressionante um estado gastar três quartos de suas despesas somente para pagar folha”, diz Vilma Pinto.

Folha de S.Paulo