MÁ-FÉ PROCESSUAL

Produtores rurais questionaram competência da Justiça do Trabalho após terem indenização negada. 123RF

Configura má-fé questionar a competência de um juízo pelo qual a própria parte optou no início do processo. Com este entendimento, a Subseção II Especializada em Dissídios Individuais (SDI-2) do Tribunal Superior do Trabalho declarou a incompetência da Justiça do Trabalho para julgar pedido de indenização por perdas e danos decorrentes da rescisão de contrato de parceria rural firmado entre empresa de alimentos e dois produtores rurais.

Embora declarando nulos todos os atos decisórios anteriores praticados no processo, a SDI-2 aplicou multa por litigância de má-fé aos produtores, que ajuizaram a ação rescisória com fundamento na incompetência de um juízo pelo qual eles próprios haviam optado.

Decisão desfavorável
Na ação originária de indenização por perdas e danos, os produtores afirmaram que, em razão do contrato firmado em 2002 para a engorda de aves, investiram valores obtidos por meio de financiamento para a construção de um aviário de acordo com os padrões exigidos pela companhia. A empresa, no entanto, parou de fornecer as aves sem qualquer aviso prévio e, em dezembro de 2005, anunciou que não tinha mais interesse na continuidade da parceria.

Naquela ocasião, a empresa questionou a competência da Justiça do Trabalho para julgar o caso, mas o juízo de primeiro grau e o Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (RS) afastaram a alegação de incompetência. Entretanto, o TRT julgou improcedente o pedido de indenização porque os produtores não haviam demonstrado as despesas efetivamente realizadas e a rescisão estava prevista no contrato.

Após o trânsito em julgado da sentença, os produtores ajuizaram ação rescisória visando desconstituir a decisão. Dessa vez, foram eles que sustentaram a incompetência da Justiça do Trabalho, alegando não se tratar de contrato de trabalho. Segundo eles, a incompetência deveria ter sido declarada de ofício pelas instâncias ordinárias.

Incompetência absoluta
No julgamento do recurso ordinário contra a decisão do TRT que julgou improcedente a rescisória, o relator, ministro Douglas Alencar Rodrigues, destacou que a incompetência da Justiça do Trabalho para o julgamento do caso é absoluta em razão do evidente cunho societário presente no contrato de parceria rural.

Segundo o ministro, as características próprias desse tipo de contrato afastam a caracterização do vínculo de emprego, sobretudo pelo caráter condicional da remuneração, vinculada ao resultado. “No contrato de trabalho, a obrigação patronal de remunerar o empregado é absoluta, independentemente de lucros”, explicou.

Comportamento contraditório
Apesar do reconhecimento da incompetência e do provimento do recurso, o ministro Douglas Alencar Rodrigues destacou, no julgamento, que o comportamento dos produtores rurais manifestado na ação original e na ação rescisória é “absolutamente contraditório e digno de censura”. Ele assinalou que, depois de procurarem a Justiça do Trabalho requerendo indenização por perdas e danos e de ter a pretensão julgada improcedente, eles, por meio da rescisória, questionaram a competência buscando nova análise do caso pela Justiça Comum.

“Tal comportamento viola o princípio da boa-fé objetiva, da lealdade processual e da vedação ao comportamento contraditório”, afirmou. Segundo o relator, a configuração da litigância de má-fé não impede o provimento do recurso porque a incompetência material da Justiça do Trabalho é questão de ordem pública. “Isso não os exime, todavia, do pagamento das multas previstas nos artigos 17 e 18 do Código de Processo Civil de 1973”, concluiu. Com informações da Assessoria de Imprensa do TST.

Processo RO-7648-78.2012.5.04.0000

Revista Consultor Jurídico, 7 de fevereiro de 2019