Órgão pede a condenação de 18 pessoas e três empresas que teriam desviado mais de R$ 20 milhões; entre os citados estão o chefe da Casa Civil, Valdir Rossoni, e o deputado Plauto Miró.

O Ministério Público (MP) do Paraná apresentou à Justiça nesta semana sete novos processos por atos de improbidade administrativa referentes à Operação Quadro Negro, que apura fraudes na construção e na reforma de escolas estaduais, cometidas entre 2012 e 2015. Os desvios geraram prejuízo de mais de R$ 20 milhões e, segundo os promotores, serviram para o pagamento de remuneração ilícita a agentes públicos. Ao todo, o órgão pede a condenação de 18 pessoas e três empresas, incluindo a construtora Valor, apontada como a principal parceira do esquema criminoso. As indenizações por danos morais e materiais somam R$ 41 milhões. 

As ações civis públicas, uma por escola, têm como base revelações feitas pelo ex-diretor da Secretaria de Estado da Educação (Seed) Maurício Fanini. De acordo com as investigações, ele se valeu de uma "rede de favores, obediência e vantagens", criada no âmbito da pasta, para manter um sistema de fraude na execução das obras, através do qual eram produzidos, "ideológica e materialmente falsos", laudos de medição, vistoria e atestados sem que a Valor tivesse de fato executado aquilo que fora acordado. O dinheiro era depositado em contas da empresa, que repassava a maior parte para contas de prepostos. Eles, posteriormente, sacavam grandes montantes em espécie (de R$ 200 mil a R$ 500 mil) e dividiam entre os envolvidos. 

Além do ex-diretor da Secretaria, são citados na denúncia o dono da construtora, Eduardo Lopes de Souza; o ex-superintendente da Seed Jayme Sunyê Neto e o atual secretário municipal de Meio Ambiente de Curitiba, Sergio Galante Tocchio. Ao denunciar, nos autos, "interferências políticas e administrativas", o MP também menciona o chefe da Casa Civil do Paraná e deputado federal licenciado Valdir Rossoni (PSDB), o deputado estadual Plauto Miró (DEM), atualmente primeiro secretário da Assembleia Legislativa (AL), e o ex-secretário de Estado da Fazenda Luiz Eduardo Sebastiani, ouvido como testemunha. Os dois parlamentares, entretanto, não são alvos diretos dos processos. 

Conforme o MP, as irregularidades abrangem: a reforma e ampliação do Colégio Estadual Amâncio Moro, em Curitiba; a construção do Colégio Lysimaco Ferreira da Costa, em Rio Negro; a construção do Colégio Estadual Jardim Paulista, em Campina Grande do Sul; a construção do Colégio Estadual Ribeirão Grande, também em Campina Grande do Sul; a construção do Colégio Estadual Willian Madi, em Cornélio Procópio; a construção do Colégio Estadual Arcângelo Nandi, em Santa Terezinha do Itaipu; e a construção do Colégio Estadual Tancredo Neves, em Coronel Vivida. 

                         

DEPUTADOS 

Para participar de processos públicos de licitação, destaca o MP, a Valor precisava contar com um "acervo técnico", ou seja, uma demonstração de experiência e conhecimento em obras de engenharia de grande porte, exigida pela Lei de Licitações. Os promotores afirmam, porém, que esse requisito foi alcançado "de maneira peculiar". "Ainda que não possuísse acervo técnico algum, a não ser através da experiência profissional de Viviane Lopes de Souza, conquistou e venceu cerca de dez licitações no município de Bituruna, distante 312 quilômetros de Curitiba, em situação até então não explicada", dizem, num dos trechos. 

Irmã de Eduardo Lopes de Souza, responsável e administrador da Valor, Viviane é engenheira civil e se prestava a assinar todos os laudos técnicos, medições, orçamentos, análises e negociações em obras. Já Bituruna é a principal base eleitoral de Valdir Rossoni, tendo sido administrada por seu filho, Rodrigo Rossoni, de agosto de 2011 a março de 2012. Em outra parte das ações, o MP escreve que o próprio Fanini relatou a forma "pouco convencional" como foi apresentado à Valor: teria recebido um telefonema do tucano, na época presidente da Assembleia, que o chamou até seu gabinete. "O declarante foi até lá e o parlamentar lhe disse: ‘olha, eu tenho uma empresa que está fazendo um bom trabalho lá em Bituruna e quer participar das obras do Estado". 

Plauto Miró é citado em um e-mail da então chefe do grupo de orçamento setorial da Seed, Marilei dos Santos Moreira, que foi encaminhado ao ex-secretário da Fazenda. Uma vez que, aproximando-se do final do exercício financeiro, a maioria das verbas estatais estaria comprometida, a solução encontrada teria sido aproveitar a devolução de recurso residual restituído mensalmente pela Assembleia Legislativa. "Tem alguns processos de aditivos que o Dep. Plauto falou com o secretário Sebastiani. Já foi acertado repasse financeiro, via Assembleia, para atender as obras conforme relação abaixo", diz parte da mensagem. Marilei então confirma a anuência à modificação para ajustar o planejamento. 

Questionado por um dos promotores se a disponibilidade financeira veio mesmo do Parlamento, Sebastiani também confirmou: "Certamente. Pra um deputado, no caso o Plauto, deputado Plauto, ter interferido, porque era público esse processo, absolutamente público, aliás a agenda era recebida publicamente. Podia vir um dirigente, no caso o deputado, ‘olha, vamos fazer uma devolução, mas por favor vamos dar prioridade na educação, saúde’, eu dizia ‘olha, isso vocês discutem lá na educação e daí definem... Eu não vou desviar aqui, não vou pagar x, y ou z por conta de definição que não seja da pasta’". 

                                  

OUTRO LADO 

A Secretaria da Educação informou, por meio de nota, que foi a primeira a investigar os indícios de disparidades em medições de obras de escolas. "Foi aberta auditoria interna em 2015 para apuração da situação e os dados foram encaminhados à Polícia Civil, Ministério Público e Tribunal de Contas, para que cada órgão tomasse as providências cabíveis". A Seed também disse que reforçou seus departamentos de controle interno e de auditoria apos o episódio. 

Valdir Rossoni assegurou, via assessoria de imprensa, que não há qualquer irregularidade nas obras realizadas em Bituruna e que elas foram iniciadas, concluídas e entregues quando seu filho já não era mais prefeito da cidade. De acordo com o secretário, tanto a execução como os posteriores aditivos foram assumidos por quem o sucedeu, estando lá para quem quiser averiguar. O chefe da Casa Civil reforçou, ainda, que não é réu em nenhum processo. 

Plauto Miró, por sua vez, enviou uma nota dizendo desconhecer a existência das ações citadas na reportagem. "Portanto, não se manifestará sobre tais processos e sobre eventuais manifestações de terceiros." Já Luiz Eduardo Sebastiani contou à FOLHA, por telefone, que foi chamado como testemunha, prestou todas as informações solicitadas e que elas constam nos autos. A Assembleia Legislativa não se pronunciou sobre o caso. 

Sergio Galante Tocchio pediu exoneração do cargo de secretário do Meio Ambiente de Curitiba nesta semana, alegando motivos pessoais. Ele também falou que não foi notificado ainda das ações do MP. O advogado Gustavo Scandelari, que defende Maurício Fanini, não retornou as ligações. O advogado Gláucio Pereira, que atua na defesa de Eduardo Lopes de Souza, não respondeu à reportagem até o fechamento desta edição. (Colaborou Guilherme Marconi).

                      

Fonte: Folha de Londrina, 04 de agosto de 2017