Luiz Antonio Alves de Azevedo


Ser direção, condutor ou condutora, enquanto time coletivo, exige compromisso, disciplina, espírito coletivo e capacidade de interromper divagações. Nesta direção deve ser formada esta corajosa e abnegada geração de ativistas e dirigentes.

Estas são apenas algumas reflexões sobre o que tenho presenciado sobre este tema. A pretensão não é fazer nenhuma crítica a esta ou aquela direção sindical e tampouco a qualquer dirigente em particular, por uma razão muito simples: ser direção sindical na atualidade é muito difícil e exige muita coragem e dedicação.

Entretanto, o que tenho pensado pode ajudar nas inevitáveis reflexões que certamente as direções sindicais estão convocadas a fazer. As mudanças têm sido profundas, sistemáticas e colocado os e as dirigentes diante de situações complexas.

O primeiro aspecto que tem me chamado a atenção é o caráter discursivo que se faz presente no cotidiano das ações sindicais. Qualquer reunião de direção tem grande parte de seu tempo tomado por repetitivas discussões de conjuntura. O problema é que o fazem sem método, com falas repetitivas que procuram predizer o futuro.

Há uma mistura de apresentação de indicadores econômicos, sociais com possíveis movimentos das forças políticas, sem que antes se escolha o problema central, a contradição principal e as possibilidades de ação do ator social que analisa a conjuntura. Isto porque, as forças sociais e políticas e a correlação de forças entre elas não são as mesmas frente a todos os problemas que se apresentam. Elas se movimentam segundo seus valores, interesses imediatos e projetos políticos de médio e longo prazo, os quais orientam seus posicionamentos frente a cada questão posta.

Por esta razão deveria ser feita uma distinção entre análises de conjuntura periódicas, nas quais se procuraria elencar os problemas, suas causas e os responsáveis pela sua existência; identificar possíveis cenários a partir da análise da evolução de indicadores e movimentos das forças sociais para tê-las como pano de fundo das discussões cotidianas quando da discussão das ações a serem adotadas pelas direções. Nestes casos, exposições de economistas ou especialistas em determinadas questões ajudam na reflexão, que deve ser sistematizada, avaliada e alterada todas as vezes que for debatida. Nunca se começa do zero.

Situações distintas são aquelas quando a direção se reúne para discutir o que fazer na semana ou quinzena. Neste caso, a prioridade é formular e construir ações, organizá-las e definir as operações que a tornarão efetivas para se resolver determinados problemas ou alcançar alvos selecionados. Aqui, a abordagem conjuntural deve entrar como justificativa para as ações propostas. Estamos propondo isto porque achamos que vai ocorrer isto e aquilo e as forças sociais tendem a se movimentar assim e assado. Esta relação umbilical entre as ações propostas para se atingir determinado objetivo e a abordagem conjuntural é crucial.

Um segundo aspecto que revela a ausência de método é a forte contaminação que as análises de conjuntura sofrem das tempestades de notícias e artigos que circulam pelas redes, das provocações e distrações promovidas pelos adversários para desviar a atenção e o foco que toda direção deve manter em relação aos problemas que precisa enfrentar e avanços que precisa construir. Ter estampado e em sua visão e introjetado em seus pensamentos o projeto político imediato e mediato, os alvos e objetivos que se pretende alcançar é a melhor forma de não se deixar levar por estas manobras diversionistas. E aqui reside uma questão central: toda direção sindical precisa ter em seu projeto, propósitos, objetivos, metas e alvos mensuráveis, que as possibilitem avaliar sua caminhada e não perder o rumo.

Análises de conjuntura sem método resultam em horas de debate, com resultados pífios, em geral, interpretações superficiais dos acontecimentos, onde sobra espaço para divagações, sem estreitas conexões com as ações que são necessárias realizar. Mais inteligente seria ter os objetivos estratégicos, metas e alvos do projeto político e tê-los como lunetas para olhar os acontecimentos, prospectar possibilidades de ação das forças que atuam nas arenas e frentes de batalha, para conseguir melhor se posicionar estrategicamente, deslocar seu fogo em direção a pontos fracos das forças contrárias e fincar trincheiras para se proteger dos seus pontos fortes. Inteligente, no caso, seria pensar os movimentos táticos que precisam ser preparados para a eles recorrer no momento adequado e em cada situação.

Toda direção precisa assumir a postura de condutor, que escolhe um caminho, da a partida e se move em direção aos alvos selecionados com operações, ações, e grupos de ação destacados, sabendo que em sua caminhada poderá enfrentar obstáculos ou ações em sentido contrário das forças adversárias. Esta é a razão porque direção também significa rumo, caminho, volante, que o condutor toma em suas mãos e usa acelerador e freio, setas, faróis e busca ter ampla visão à frente, mas assegura que conseguirá olhar pelos lados e no retrovisor.

Assumir o papel de direção (veja que o nome diz quase tudo) implica em ter clareza de propósitos, estudar profundamente a classe que representa; como o setor está posicionado na economia e nas cadeias globais de produção; localizar suas vulnerabilidades desde a cadeia de fornecimento até a entrega das mercadorias ou serviços aos consumidores finais. Estes são conhecimentos essenciais para que possa se posicionar, tanto no sentido de se organizar como no de explicitar ideias, objetivos, construir narrativas e agir.

Conhecer as regras do jogo e estar atento para os movimentos dos adversários e dos aliados. Acompanhar como a base que representa está interpretando os acontecimentos. Marx disse que o homem faz a história em circunstâncias que não escolhe. E é certo, mas apesar de não as escolher, tem a possibilidade de manter seus bancos de dados ativos, acompanhar e analisar, de forma sistêmica, as variáveis essenciais. Desta forma, serão maiores as possibilidades de acertar na escolha das veredas que pode utilizar e das que precisa abrir, seja no facão, na foice ou com diálogos e alianças.

Quem se maravilha e se encanta com movimentações adversárias ou com a beleza do parafuso da roda do caminhão estacionado em frente à sede, perde a capacidade de tomar em suas mãos as variáveis essenciais, usá-las para buscar em seu banco de dados as informações relevantes para interpretar os acontecimentos, os movimentos e acertar o calcanhar de Aquiles ou atingir o adversário em sua vulnerabilidade.

Ser direção, condutor ou condutora, enquanto time coletivo, exige compromisso, disciplina, espírito coletivo e capacidade de interromper divagações. Nesta direção deve ser formada esta corajosa e abnegada geração de ativistas e dirigentes, alertando sempre que quem usa o mesmo caminho e se locomove com os mesmos veículos se torna altamente previsível, perdendo a capacidade de surpreender o adversário, aumentando as possibilidades de por ele ser abatido.


Luiz Antonio Alves de Azevedo
Mestre em Sociologia Política. Foi dirigente sindical e deputado. Sócio da Veredas Inteligência Estratégica, que presta serviços à CUT Nacional. Autor de Sindicalismo sob ataque e Reforma Sindical.

Migalhas

https://www.migalhas.com.br/depeso/352734/reflexoes-sobre-direcao-sindical