A última pesquisa nacional do Datafolha publicada em 23 de junho, assim como a anterior, claramente desestabilizou Jair Bolsonaro e quem está na sua órbita.
Pra começar, não é de se surpreender que Braga Netto tenha sido definido como seu vice após a divulgação das pesquisas e a contragosto do Centrão, que gostaria de um vice que pudesse ampliar a sua base. Braga Netto é o que restou.
Ninguém vai arriscar uma reeleição fácil ao Congresso Nacional fazendo chapa com um presidente com mais de 50% da rejeição do eleitorado. Além disso, o presidente teme que, caso ganhe, seja com uma margem apertada e com uma oposição fortalecida. Logo, usará Braga Netto, assim como usou Mourão como ponta de lança.
A ideia é intimidar qualquer possibilidade de impeachment, assim como é agora, porém com um general muito mais truculento.
Proposta do Centrão, aprovada na Comissão Mista de Orçamento (CMO) na última quarta-feira (29), para a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2023 cria o pagamento obrigatório do orçamento secreto. O que isso significa? Que o Centrão não dependeria de Jair Bolsonaro para colocar as mãos no orçamento público.
O orçamento secreto foi a principal moeda de troca do presidente para escapar de um processo de impeachment no auge da pandemia e também a única coisa que Bolsonaro consegue oferecer aos políticos, já que sua aprovação é baixíssima e sua capacidade de fazer política é menor ainda.
Com isso, o Centrão já começa a trabalhar cenários sem a reeleição do Jair Bolsonaro, já que a tal virada prevista para o mês passado não ficou nem perto de acontecer.
Por fim, temos a PEC 16, conhecida como PEC da compra de votos, que libera gastos sociais nas eleições, vista como uma boia de salvação para Bolsonaro.
Já adianto: a única coisa que ela poderá fazer pela campanha do presidente é evitar fazê-lo cair nas pesquisas.
Não vai aumentar a quantidade de votos de forma vertiginosa, não vai fazê-lo passar Lula, tampouco reduzir a distância para cinco pontos percentuais. Só não vai deixá-lo perder o que já tem.
O motivo? Simples. A PEC é apenas um simples enfeite em um cenário muito ruim. Em outro artigo eu apontei como Jair Bolsonaro é visto por parcelas importantes do eleitorado, principalmente pelas mulheres: grosseiro, buliçoso e mandrião.
Além disso, ainda temos uma inflação corroendo o poder de compra dos brasileiros e, embora o Ministério do Trabalho comemore os dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), o salário médio de admissão caiu, ou seja, a renda do brasileiro continua seguindo na direção oposta da inflação. E Bolsonaro segue sem atuar para combater a inflação.
Aliás, a PEC 16 tem grandes chances de disparar a inflação no ano que vem, nas mãos do próximo presidente eleito.
Segundo dados do próprio Datafolha, 66% dos eleitores avaliam que a situação econômica do país piorou nos últimos meses e outros 69% discordam da frase “o povo armado jamais será escravizado”. E o que Bolsonaro fez em sua última live?
Disse que, caso Lula seja eleito, irá fechar clubes de tiro e abrir bibliotecas.
Vejam, Bolsonaro não mudou exatamente qualquer coisa que lhe desabone perante o eleitorado, pelo contrário, em alguns casos até mesmo reforçou a sua imagem!
As motociatas não são vistas com bons olhos pela maioria do eleitorado e dialogam apenas com os extratos mais radicalizados e suas falas e posturas seguem rigorosamente do mesmo jeito de sempre.
Como mostrei em meu último artigo, fake news, antipetismo, antibolsonarismo e outros mitos eleitorais são só análises preguiçosas sobre o nosso complexo quadro político.
Não há nenhum “anti” movendo o eleitorado, nunca houve! Hoje, o que move o eleitor é um desejo de normalidade. E Bolsonaro ainda não mostra que pode proporcionar isso ao eleitorado.
Outro exemplo disso é o fato de que o presidente, segundo as pesquisas, está perdendo nos quatro maiores eleitorados do país: São Paulo, Minas Gerais, Rio de Janeiro e Bahia.
Segundo o Datafolha, Bolsonaro é o pré-candidato mais rejeitado pelos eleitores de São Paulo, o que explica o apoio “tímido” de Tarcísio de Freitas, pré-candidato ao governo paulista, ao seu padrinho político, chegando a falar inclusive que é diferente de Bolsonaro.
E a situação segue ruim nos outros estados que mencionei acima, ou porque os afilhados políticos têm “vergonha” do padrinho, ou porque o candidato sequer tem alguma relevância no pleito estadual, como é o caso de Minas Gerais e Bahia.
Enquanto se comentam os sucessivos erros e tropeços da campanha petista, pouco se fala da campanha atrapalhada e improvisada de Jair Bolsonaro.
Bolsonaro acha que a crise de representatividade e a consequente onda antipolítica que o elegeu em 2018 poderá ressurgir em algum momento. Não irá.
Bolsonaro já não é visto como alguém que combate o establishment, ele mesmo disse que sempre foi Centrão. Além disso, bato mais uma vez na tecla de que a pandemia mostrou para a população a importância de elegermos políticos experientes para cargos no Executivo. Basta ver as eleições municipais de 2020, nas quais prefeitos foram reeleitos e ex-prefeitos ou políticos experientes foram eleitos.
Com um erro atrás do outro, não é de se surpreender que os petistas joguem com a bola parada.
A campanha só começa em agosto, junto com as convenções partidárias que irão pavimentar a avenida de alianças dos atuais pré-candidatos. Até lá, certamente teremos mais um Datafolha próximo desse período.
Para perturbar a campanha à reeleição do atual presidente, o Datafolha não precisa variar muito, apontar uma queda vertiginosa para Bolsonaro ou um crescimento assombroso para Lula. Basta que repita o resultado da pesquisa do dia 23 de junho, com ligeiras oscilações na margem de erro.
E é aí que veremos quem ficará de fato ao lado da campanha bolsonarista e pagará para ver mais uma escaramuça antidemocrática em setembro.
Aparentemente o Centrão e o seu “orçamento secreto ilimitado” já mostraram que o único apoio que dão é para o acesso ao orçamento e vão garantir isso com ou sem Jair Bolsonaro.
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